quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

De volta à barbárie

Assistindo ontem o paredão do BBB10 percebi o quanto o Brasil é um país antagônico. Durante séculos o povo brasileiro lutou pelos direitos humanos; direito da livre expressão; direito a liberdade sexual; direito de conviver numa nação sem preconceitos e rótulos. Foram inúmeros indivíduos que sacrificaram suas vidas aspirando um Brasil sem preconceitos, na tentativa de construir uma nação onde todos pudessem exercer sua cidadania de fato e de direito.
Não podemos esquecer que a historia brasileira foi, e ainda continua sendo, repleta de fatos de intolerâncias contra as minorias. Quantos índios e negros foram escravizados, mortos e ceifados seus direitos? Quantas mulheres foram destituídas do direito de decidir o seu próprio futuro, tornando meros objetos do machismo? Quantos homossexuais não foram agredidos e mortos pelo fato de lutar pela liberdade de expressar seu amor? Em nenhum momento da historia a classe dominante preocupou-se com os excluídos e os marginalizados, pelo contrário, procuraram cada vez mais segregar as minorias nos guetos da sociedade.
Quando achamos que estamos superando os nossos limites da intolerância ao próximo, assistimos em canal aberto a carnificina dos direitos individuais de livre expressão. Sabendo que um dos maiores mecanismo formadores de opiniões é a televisão, a qual tem um papel crucial na formação de consciências humanitária, verificamos que este papel foi jogado na lata de lixo em prol da audiência e, quem sabe, obter mais lucros com a violação dos princípios éticos, morais e políticos.
Quantos brasileiros neste momento estão regozijando ao saber que um indivíduo másculo, com gírias toscas, comportamento selvagem e heterossexual foi escolhido para continuar na luta pelo um milhão e meio de reais?Algo contra? Não! Todos têm o mesmo direito, porém, não podemos esquecer que neste caso outra pessoa foi oprimida e marginalizada. Será que o resultado não seria diferente se a concorrente no paredão fosse heterossexual? Quantas pessoas não explodiram de alegria ao escutarem que um indivíduo iria quebrar o dedo da adversária e enchê-la de pancada até ser atendida num pronto-socorro se ela não fosse mulher? Quantos brasileiros não gritaram aos quatros cantos do país o seu apóio ao candidato e repúdio ao adversário do sexo feminino e de orientação sexual oposta?
“É isso mesmo Dourado, quebra o dedo desta sapatona!” “Vai Dourado, elimina essa bigoduda!” “Mostra ao Brasil que somos um país macho!” “Vamos acabar com essa viadagem no Brasil!” Essas e inúmeras outras frases foram clamadas em todo o Brasil. Contudo, alguém percebeu algo nestas frases? Por que será que em nenhuma das frases a Angélica não foi chamada pelo seu nome de batismo? Por que não o chamaram o Dourado de bruto, de selvagem, de tosco? Sabe por quê? Pelo simples fato da Angélica ser mulher e não ser heterossexual. Infelizmente a sociedade machista brasileira não aceita que a mulher ocupe espaço de destaque e muito menos recuse se submeter aos desejos sexuais masculinos.
Entretanto, não só culpo os brasileiros por esta atitude; a emissora contribuiu para que se propagasse uma cultura de intolerância e violência contra o próximo. Bem criativa as charges exibidas pelo programa. Porém, esquecemos de fazer uma análise profunda da ideologia imposta de forma astuciosa. Por que sempre as caracterizações dos indivíduos homossexuais são exacerbadas pela orientação sexual? Será que alguém percebeu que o veículo motorizado da Angélica tinha formato de sapato? Por que será que tinha esse formato e qual finalidade tinha? Seriam estereótipos...?
Fico ainda mais triste ainda em saber que milhares de brasileiros se lamentam ao ver na mídia indivíduos de orientação sexual diferente das deles e acham que os mesmos são influências negativas para a educação dos filhos. No entanto, nenhum pai ou mãe questiona os valores grotescos do Dourado. Será que estes pais preferem que seus filhos sejam agressivos, bandidos, agressores, assassinos a serem gays ou lésbicas? Cadê os valores humanos da família? Ser um indivíduo de orientação sexual diferente é tão tenebroso assim?
Não entendo o por quê dos brasileiros almejam tanto um país sem violência ao passo que nas pequenas atitudes se mostram intolerantes. Se quisermos educar nossos filhos na cultura de paz, valorizando os princípios éticos da boa convivência; é preciso, antes de tudo, aprender a respeitar o próximo. Ter uma tonalidade de cor diferente, uma orientação sexual diferente, um aspecto físico diferente não é sinônimo de inferioridade e, muito menos, de desprezo. Enquanto estivermos cultuando os valores de uma sociedade machista e preconceituosa nunca iremos sair do estado de barbárie. Não adiantar se gloriar em ser no futuro a quinta maior economia do mundo se o nosso povo não souber conviver com o diferente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário